Prefeito de Picos é condenado à perda de direitos políticos por contratar empresa de vereador

A juíza substituta Jerusa de Oliveira Dantas Passos, da Vara Cível e Criminal da Subseção Judiciária de Picos (PI), condenou o prefeito do município Padre José Walmir de Lima, o Padre Walmir, à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de três anos, ao pagamento de multa civil no importe de cinco vezes no valor da sua última remuneração e proibiu ainda o gestor de contratar com o poder público e de receber benefícios e incentivos fiscais ou creditícios, de forma direta ou indireta, mesmo que por meio de pessoa jurídica interposta da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos. 

O gestor de Picos é acusado de ter contratado a empresa de um então vereador do município, a Pivel Veículos Limitada, que tinha como um dos sócios o político Antônio Evandro dos Reis Antão. Feito que é proibido pela Constituição da República.

O Ministério Público Federal (MPF) afirmou que o município de Picos celebrou o convênio n.º 8141202/2014 com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, pelo que realizou o Pregão Presencial n.º 051/2015 para aquisição veículos, do qual saiu vencedora a empresa Pivel Veículos Ltda.

Na sua decisão a magistrada sustenta que: 

“O fato traz a contratação realizada entre município e empresa que tem como sócio administrador vereador daquela, o que é proibido legislação brasileira, nos termos  do art. 54, I, a, da Constituição Federal c/c o art. 28 da Lei Orgânica Municipal/LOM de Picos/PI:

‘Constituição Federal da República Federativa o Brasil 

Art. 54. Os Deputados e Senadores não poderão: 

I – desde a expedição do diploma: 

a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes; 

[…] 

Lei Orgânica do Município de Picos/PI 

Art. 28 – O prefeito, o vice-prefeito, os vereadores e os servidores municipais bem como as pessoas ligadas a qualquer deles por matrimônio e parentesco, afim ou consanguíneo, até o terceiro grau, inclusive ou por adoção não poderão contratar com o município, substituindo a proibição até 6 (seis) meses após finda as respectivas funções. 

Parágrafo Único – Não se incluem nesta proibição os contratos cujas cláusulas e condições sejam uniformes para todos os interessados’”.

Observou ainda que  “a Lei Orgânica de Picos/PI está simétrica com a legislação constitucional, porque proíbe que membros do seu Poder Legislativo possam contratar com o respectivo município”. 

E mesmo que “a norma municipal fosse silente nesse ponto, a própria Constituição Federal estendeu aos vereadores as proibições e impedimentos direcionados aos congressistas da União, nos termos do art. 29, IX, da CF/88”. 

Elenca que “a proibição contida no art. 54, I, a, da CF/88 não diz respeito apenas aos contratos firmados diretamente pelo vereador pessoa física, alcançando também as pessoas jurídicas que são de propriedade e/ou controladas pelo legislador (art. 54, II, a, CF/88)”. 

Cita que “os réus alegaram, em suas defesas, que o contrato firmado, por ter sido precedido de procedimento licitatório, era constituído por cláusulas uniformes, que é justamente a exceção permitida na hipótese, de acordo com a parte final da alínea a do I do art. 54 da CF/88 e do parágrafo único do art. 28 da LMO de Picos/PI”.

“Contudo”, dá continuidade, afirma “que os negócios jurídicos realizados por meio de licitação não configuram, por si só, cláusulas uniformes, porque, apesar de a maioria das regras ter sido estipulada previamente, a principal, que diz respeito ao preço da contraprestação, fica a cargo dos concorrentes da licitação, o que é suficiente para desconfigurar a existência, exclusivamente, de cláusulas uniformes”. Cita para fundamentar sua decisão jurisprudência do Superior Tribunal Eleitoral (STE).

“Portanto a contratação realizada entre o Município de Picos/PI e o então vereador Antônio Evandro dos Reis Antão está em frontal desrespeito às legislações constitucional e municipal, suficiente para confirmar a materialidade do fato que integra a acusação feita pela parte autora”, pontuou.

A decisão da juíza federal Jerusa de Oliveira Dantas Passos também rebateu outras argumentações da defesa, de que não houve prejuízo ao erário. Só que o que está em jogo não é isso, pelo menos a princípio.

“Atente-se, porém, que o tipo de prejuízo que se emerge do fato não é daqueles que podem ser mensurados pecuniariamente, mas sim daqueles que ferem a imagem da Administração Pública perante a sociedade, pois o contrato firmado entre município e seu próprio vereador traz em si mesmo uma desconfiança sobre a sua probidade, por isso, além de desrespeito ao princípio administrativo da legalidade, vai de encontro ao princípio da moralidade administrativa, os quais, não por menos, são previstos no caput do art. 11 da Lei 8.429/1992 (LIA), como improbidade administrativa”, argumentou.

Disse que “igualmente, os argumentos suscitados de que o processo licitatório já estava quase concluído quando o demandado José Walmir de Lima assumiu a prefeitura de Picos/PI e de que ele apenas teria assinado o contrato não devem prosperar, tendo em vista que o pouco tempo de mandato, quando da formalização do negócio, não o exime da responsabilidade por transgredir a legislação, mais uma vez evidenciado, na verdade, o descaso com as regras da Administração Pública”.  

Acresceu que “o requerido José Walmir de Lima ainda aduziu que os fatos se tratariam, no muito, de mera irregularidade formal, alegando o princípio da insignificância. Esse argumento também não se sustenta, porquanto a transgressão cometida pelos réus não estão apenas no campo das formalidades, tratando-se, pois, de afronta a legalidade e a moralidade administrativas, que devem ser observadas. Incabível, portanto, a utilização do princípio de insignificância no presente cenário, diante da necessidade de aplicação dos princípios fundamentais para o devido funcionamento da Administração Pública”.

“Por derradeiro, a aprovação das contas referentes ao convênio firmado com o Ministério do Desenvolvimento Agrário (Id. 81839138), nos moldes apresentados, demonstrou que os réus não enriqueceram ilicitamente, nem causaram prejuízo pecuniário ao erário, a ensejar, também, a fixação das sanções próxima ao mínimo legal, com não incidência da sanção mais grave de perda da função pública (artigo 12, III, e parágrafo único da Lei n.º 8.429/92)”, finalizou.

TAMBÉM CONDENADO

O então vereador Antônio Evandro dos Reis Antão também foi condenado na sentença. A determinação judicial é de que o então vereador tenha os direitos políticos suspensos pelo prazo de 3 anos, pague multa civil no importe de cinco vezes o valor da sua última remuneração recebida como vereador e que se furte de contratar com o poder público e de receber benefícios e incentivos fiscais ou creditícios, de forma direta ou indireta, ainda que por meio de pessoa jurídica interposta da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos, vez que está, pelo próprio teor decisão, proibido. 

Ambos podem recorrer da sentença.